Minhas Leituras #23: O retrato de Dorian Gray – Oscar Wilde

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“Um romance filosófico do final do século XIX, que ainda se mantém atual”

Título: O retrato de Dorian Gray
Autor: Oscar Wilde
Editora: Penguin-Companhia
Ano: 2012
Páginas: 264
Tradução: Paulo Schiller
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“[…]gente extremamente antiquada que não se dera conta de que vivia em uma época em que as coisas desnecessárias eram as únicas necessidades[…]” (WILDE, Oscar. O retrato de Dorian Gray. Penguin-Companhia, 2012. p. 112)

Um romance filosófico do final do século XIX, que ainda se mantém atual. O único romance publicado de Oscar Wilde gerou muita polêmica em sua época e hoje é considerado um clássico da literatura britânica. Um pouco da vida do autor e de suas ideias estão refletidas nesse livro, pois ele possuía uma vida tão polêmica quanto suas obras. Conheça um pouco sobre o autor e esse título, que é repleto de interpretações, um prato cheio para quem gosta de uma boa leitura e, principalmente, para quem gosta de psicologia.

Um autor polêmico numa época de grande repressão

A Inglaterra do século XIX era muito preconceituosa, com um grande pensamento conservador predominando sobre o país. Os últimos anos da vida de Oscar Wilde foram conturbados por essa visão que a população inglesa possuía.

Levou uma vida considera “normal”. Filho de uma família abastada, estudou em Oxford, trabalhou em jornais, se casou e teve filhos, escreveu alguns contos e um romance. Porém, por volta de 1891, Wilde conheceu Lord Alfred Douglas e os dois tornaram-se amigos. Dessa amizade, nasceu uma paixão. Wilde se apaixonou por Douglas e os dois trocaram cartas e poemas.

Naquele tempo, ser homossexual era considerado um crime. Wilde foi traído e um processo por “atos de indecência” foi movido contra ele, por Douglas e seu pai, Marquês de Queensberry. Isso resultou numa pena de dois anos de reclusão. A família de Wilde se sentiu desonrada. Mudaram de nome e deixaram o país. Após Wilde deixar a prisão, se exilou na França, onde veio a falecer, em 1900, pobre, provavelmente vítima de meningite.

“Mas a beleza, a beleza de verdade, termina onde começa a aparência de intelectual. O intelecto é, em si, uma forma de exagero e ele destrói a harmonia de qualquer rosto”. p. 9

Mais polêmicas

Quando Wilde enviou seu manuscrito para ser publicado na Revista Lippincott’s Monthly, não foi muito bem recebido pelo editor. O original possuía treze capítulos e mais de quinhentas palavras foram retiradas do texto, pois o editor as considerou como impróprias. O editor temia que o original fosse ferir a moral do povo inglês.

Para sua publicação em forma de livro, em 1891, os editores pediram que Wilde complementasse o texto, pois achavam que estava muito curto, um tanto cru. Dessa forma, sete capítulos foram adicionados e a versão em livro de ‘O retrato de Dorian Gray’ acabou ficando com vinte capítulos. A versão da Penguin-Companhia é uma tradução dessa versão em livro, com os vinte capítulos e o texto original censurado. A versão original do manuscrito, sem censura, foi publicada no Brasil pela Biblioteca Azul.

As diferenças entre as versões não são tão gritantes, o que foi censurado foram passagens que continham partes que eram tabus à época, como conteúdo considerado homossexual, por exemplo. A maior diferença fica pela quantidade de capítulos, já que a versão original é menor que a versão de 1891, com menos conteúdo e sem censura. A admiração entre os personagens masculinas do livro é um tanto quanto romantizada demais, porém não há nenhuma relação entre dois homens na história. Se hoje o preconceito ainda existe, imagine como era no século XIX.

“Na verdade, é mais provável que, quanto menos sincero for o homem, mais puramente intelectual será a ideia, pois nesse caso, ela não seria tingida por suas aspirações, seus desejos ou preconceitos”. p.16

O enredo

Tudo começa com o artista Basil Hallward pintando um retrato de seu amigo Dorian Gray, um jovem de grande beleza, beleza essa que encantou tanto o pintor que ele sentia ciúmes do amigo e o idolatrava como uma espécie de “musa inspiradora”. No dia em que Basil termina de pintar o retrato, Dorian conhece Lord Henry, um jovem boêmio, rico e muito inteligente e manipulador. Henry gosta muito de filosofia, porém seu pensamento é um pouco preconceituoso e é uma pessoa que valoriza mais a beleza do que o conteúdo.

Todos ficam impressionados com a obra de Hallward, com a semelhança entre o retrato e o jovem real. Nesse momento, Gray, que é extremamente narcisista, fica triste com o fato de que irá envelhecer e seu retrato continuará bonito e jovem para sempre. Esse é um grande marco do enredo.

Com o tempo, Dorian acaba de distanciando de Basil e sua amizade com Lord Henry se fortalece. Henry fica fascinado com a beleza e a inocência de Gray e acaba transmitindo seu hedonismo ao rapaz. Dessa forma, o jovem passa a valorizar e usar a sua beleza a seu favor, cometendo atos questionáveis. O retrato, como ele havia desejado, acaba refletindo sua alma, funcionando como um reflexo de sua índole. É uma grande sacada do autor, com o quadro funcionando como a psique de Dorian Gray. Temos Dorian como o inconsciente, cheio de atos impulsivos; o retrato como o consciente, pois ao observar a obra de arte, o jovem toma consciência de suas ações; e Basil, funcionando como um superego, tentando impor limites ao inconsciente.

O livro pode ser interpretado de diversas outras formas também. E o enredo não é apenas isso, há muitas partes filosóficas, outras românticas, algumas de mistério e outras bem irônicas. Talvez a mensagem final seja um pouco moralista, porém a luta de um homem com o sua psiquê é o grande ponto do livro. O exagero do autor em certos termos, como a beleza e sua forma romântica de se expressar, são influências do pensamento e mitologia grega, que o autor tanto adorava.

“Hoje em dia as pessoas têm medo de si mesmas. Esqueceram-se da mais elevada das obrigações, a obrigação que cada um deve a si próprio”. p. 26

Sobre a edição

As publicações da Penguin-Companhia possuem um padrão: capas padronizadas, em versão paperback (capa mole sem orelhas), papel Pólen Soft com boa diagramação. São edições que sempre trazem algum conteúdo extra, como introduções sobre a obra e/ou o autor. Porém, essa apenas trouxe uma breve introdução escrita por Wilde, comentando um pouco sobre o que a arte significava para ele.

A tradução ficou por conta do experiente Paulo Schiller, que já traduziu obras do Inglês, Francês e do Húngaro. Ele é um psicanalista, por isso utilizou bem os termos dessa escola. É comum ver em diversos livros o uso do termo “subconsciente”, quando na verdade esse não é um termo utilizado em psicanálise. Para se referir a coisas que não estão conscientes (não acessíveis em primeiro momento), utiliza-se “inconsciente”. Foi bom ver o termo ser bem utilizado. Também é considerada a melhor tradução disponível no mercado hoje. A revisão fez um ótimo trabalho, não deixou erros passarem.

“O riso não é um mau começo para uma amizade, de maneira nenhuma, e é de longe o melhor final”. p.15

Conclusão

Um clássico com uma filosofia atual. Leitura rápida e fácil, não é um livro difícil de ser lido ou compreendido. As interpretações são (mais ou menos) explicadas no livro, porém muito pode ser obtido com uma reflexão mais profunda sobre os temas apresentados. Um prato cheio para quem gosta de ler livros com algo a mais no enredo do que apenas o entretenimento. Possui várias citações interessantes, que podem agregar no conhecimento. Quem gosta de psicanálise irá encontrar várias referências, pois, assim como Wilde, Freud também adorava a mitologia grega. Recomendado, tanto o livro quanto essa edição.

“Em seus afazeres com o homem, o Destino nunca encerrava as contas”. p. 221

Minha nota (de 0 a 5): 4,5

Alan Martins

Algumas citações extras:

“Pareciam capazes de proporcionar uma forma plástica a coisas sem forma, e de ter uma música própria, doce como a da viola ou da flauta. Simples palavras! Existiria algo tão real quanto as palavras?” p. 28

“Para testar a verdade devemos vê-la sobre uma corda bamba. Quando as Verdades se tornam acrobatas, nós podemos julgá-las”. p. 50

“Para voltar à juventude, devemos simplesmente repetir as nossas loucuras”. p. 52

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A capa possui um grande significado com o enredo.

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Autor: Alan Martins

Graduado em Psicologia. Amante da Literatura, resenhista e poeta (quando bate a inspiração). Autor e criador do Blog Anatomia da Palavra. Não sou crítico literário, porém meu pensamento é extremamente crítico. Atualmente graduando em Letras.

24 pensamentos

  1. Um livro gostoso e complexo. Fiz a leitura da obra e assistir ao filme. São recomendações que faço.
    Ótima dica de leitura e aliás, adoro seu blog, sempre que tenho um tempinho passo por aqui para te acompanhar. Gosto muito mesmo.

    Tenha um ótimo dia!

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  2. Não sei se já o fizeste mas lê o De Profundis, o que escreveu ao Bosie quando estava na prisão.E as peças de teatro também valem muito a pena, The importance of being earnest está na minha lista 😉 Ele tem uma grande componente clássica, sim, e lê-lo é ficar a conhecer mais da estética e filosofia da arte. Isso nota-se muito no De profundis. É por isso que eu gosto tanto dele 😉

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  3. Que resenha completa! Ótimo para conhecermos além de somente a obra, a vida por trás de quem a criou. Polêmicas atrás de polêmicas esse autor! Bom que tem muita experiência para trazer em sua ficção hahahaha. Adorei, parabéns pelo post!

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