Minhas Leituras #63: A conquista da felicidade – Bertrand Russell

Capa do livro A conquista da felicidade, Bertrand Russell

“Este não é um guia sobre como ser feliz”

Título: A conquista da felicidade
Autor: Bertrand Russell
Editora: Nova Fronteira
Ano: 2017
Páginas: 160
Tradução: Luiz Guerra
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“[…] mas nenhum sistema tem condições para funcionar enquanto os homens forem tão infelizes que o extermínio mútuo lhes pareça menos terrível do que enfrentar continuamente a luz do dia.” (RUSSELL, Bertrand. A conquista da felicidade. Nova Fronteira, 2017, p. 12)

Com este livro, Bertrand Russell, um dos mais importantes filósofos da primeira metade do século XX, buscou fazer uma análise sobre as causas da felicidade e da infelicidade para o homem moderno.

Filósofo pouco difundido no Brasil

Apesar de ser um autor bastante conhecido mundialmente, as ideias de Bertrand Russell, autor laureado com o Nobel de Literatura em 1950, não são muito difundidas no Brasil, não em nível acadêmico. Além de filósofo, ele foi um grande matemático, um dos mais importantes de seu tempo (talvez seu lado matemático seja mais estudado por aqui).

Nascido em uma das mais abastadas e influentes famílias britânicas, Russell não se escondeu atrás do conforto que o dinheiro pode proporcionar. Ele foi um grande defensor das liberdades individuais e um grande pacifista. Engajou-se em protestos contra a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, além de ser um grande crítico das operações dos Estados Unidos no Vietnã. Seu pacifismo levou-o à prisão durante a Primeira Guerra Mundial, um ato do Governo britânico que ele considerou uma afronta à liberdade de expressão.

Ao longo de sua longa vida, escreveu diversos livros, de teor crítico, filosófico e muitos outros sobre matemática. Sua obra mais conhecida, provavelmente, é ‘A história da filosofia ocidental’, uma longa análise histórica das diversas correntes filosóficas que surgiram no ocidente, desde filósofos pré-socráticos até os grandes nomes do início do século XX. Para aqueles que lutam pela liberdade, este é um autor que merece ser conhecido.

“Uma vida feliz tem que ser, em grande medida, tranquila, pois só em um ambiente calmo pode existir a autêntica alegria.” p. 44

Ler sem preconceitos

Ao conhecer a história do autor, o leitor pode ter o seguinte pensamento: o que um cara rico, de vida boa, pode me falar sobre felicidade? É um pensamento que tem sua lógica, porém é carregado de preconceito. Em questões financeiras, a vida de Bertrand Russell não foi difícil, mas quem disse que basta dinheiro para ser feliz? Ele mesmo fala, em certa parte deste livro, que chegou a pensar em suicídio, ideia que surgiu, em parte, por sua boa condição financeira, um excesso de conforto.

Para o autor, o dinheiro traz sim felicidade, mas uma felicidade que supre as necessidades naturais do ser humano. Esse tipo de felicidade chega a um nível que não pode ser ultrapassado; não se trata da felicidade verdadeira. Será que uma pessoa é realmente feliz com um trabalho que odeia, que a deixa cansada, apesar de o salário ser excelente? A leitura deste livro daria uma resposta negativa à essa pergunta.

Partindo de experiências pessoais e de todo o conhecimento literário que possuía — e não era pouco —, Russell analisou diversas questões da vida de um homem moderno, apontando quais situações trazem felicidade, ou infelicidade, além de propor soluções para fugir das situações negativas, as que causam a infelicidade.

“[…] porque [o homem] esquece que uma parte indispensável da felicidade é ainda precisar de algo que se deseja.” p. 21

Então é autoajuda?

Não, negativo. Bertrand Russell não foi o primeiro e nem será o último filósofo a fazer esse tipo de análise e propor soluções. Autoajuda seria criar receitas para algum problema que aflige o ser humano, dizer o que a pessoa deve parar de fazer, mudar seus hábitos, muitas vezes soluções baseadas naquilo que funcionou para o autor, ou em ideias do senso comum.

O livro foi publicado, originalmente, em 1930, então é a sociedade dessa época que estava sendo analisada. E surpreende como muita coisa ainda permanece igual nos dias atuais, ou ainda mais difíceis (causando ainda mais infelicidade). Russell dividiu a obra em duas partes: a primeira se propõe a analisar as causas da infelicidade, a segunda as da felicidade. Trabalho, família, tédio, inveja, entusiasmo; são muitas as variáveis investigadas.

A proposta do autor foi a de escrever um livro acessível, nada muito erudito. Bem, a linguagem utilizada não é complicada, mas também não é simplista. Cada capítulo fala sobre um assunto em específico, em como essa questão afetará a felicidade e o porquê disso acontecer. Apesar de ser um livro curto, o conteúdo não é raso, há profundidade nas observações de Russell. Não serão encontradas receitas durante a leitura, entretanto o leitor terá muito conteúdo para refletir a respeito.

“O que as pessoas temem, quando se lançam à luta, não é não poder conseguir um café da manhã no dia seguinte, mas sim não conseguir eclipsar seus vizinhos.” p. 31

Sobre a edição

Esta edição faz parte da coleção Clássicos de Ouro, que a editora Nova Fronteira lançou em 2017. São edições em capa dura, seguindo um elegante padrão estético. O miolo é em papel Pólen Soft (assemelha-se, a informação não está especificada), com boa gramatura, deixando a leitura agradável.

Não consegui encontrar alguma informação sobre o tradutor Luiz Guerra. Seu trabalho foi competente, o livro não é complicado, tradução não muito exigente. Texto coeso e de fácil compreensão, o tradutor não quis “inventar moda”.

“Se o trabalho não é tão duro que deixe a pessoa sem forças, o trabalho tirará de seu tempo livre muito mais prazer que o ocioso.” p. 131

Conclusão

Este é um livro escrito por um filósofo, baseando-se em conhecimentos filosóficos — algo que o autor possuía em abundância — e em observações pessoais, então não espere um livro de autoajuda. Não é um guia sobre como ser feliz, com receitas mirabolantes para você se tornar a pessoa mais feliz do mundo. É algo muito melhor que isso: uma leitura que faz refletir. Ao longo do texto, Bertrand Russell analisa diversas questões da vida do homem moderno que podem causar infelicidade, assim como aquelas que trazem felicidade. Ele se arrisca a dar algumas soluções aqui e ali, mas seu foco é a investigação. Apesar de ter sido publicado, originalmente, em 1930, a obra é muito atual, pois aborda assuntos intrínsecos à vida humana. Escrita descomplicada, sem a intenção de ser erudita, mas passando longe de ser simplista. São muito boas e interessantes as análises feitas pelo autor. Claro, nem tudo pode ir de acordo com aquilo que o leitor acredita, mas essa é a intenção da filosofia: nos surpreender com diferentes ideias, a fim de causar reflexão, tirar o leitor da zona de conforto.

“[…] uma vez que o principal aspecto da racionalidade é a harmonia interior, o homem que a consegue é mais feliz com sua liberdade de contemplação do mundo e no emprego de suas energias para alcançar objetivos exteriores do que aquele que se acha mergulhado em conflitos íntimos.” p. 70

Minha nota (de 0 a 5): 4

Alan Martins

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Autor: Alan Martins

Graduado em Psicologia. Amante da Literatura, resenhista e poeta (quando bate a inspiração). Autor e criador do Blog Anatomia da Palavra. Não sou crítico literário, porém meu pensamento é extremamente crítico. Atualmente graduando em Letras.

13 pensamentos

  1. Também ainda não conheço esse livro. Resenhas abrem horizontes de curiosidade. Hoje escutei algo interessante que assim como não devemos confundir tristeza com depressão, também não devemos confundir alegria com felicidade. A alegria é momentânea, a felicidade é construída…

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    1. Realmente, além de que depressão não tem somente a tristeza como sintoma, mas esse foi o que pegou, o que é mais recorrente. Esse livro vai nessa linha de que a felicidade é algo que se constrói ao melhorar detalhes de nossa vida, que num geral farão grande diferença. Recomendo a leitura.
      Grande abraço. Obrigado pela visita.

      Curtido por 1 pessoa

    1. Acredito que a maioria pensa como você, mas há bastante gente que tem esse preconceito. Conhecimento não deve ter preconceitos!
      É um livro bem curtinho, dá para ler em pouco tempo. Além de ser muito bom, faz a gente parar para pensar sobre diversas situações da vida.
      Obrigado pela visita.
      Abraço! 🙂

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  2. Li o No Que Acredito e alguns artigos de Bertrand Russel. Considero a opinião dele uma das que mais vale a pena refletir. Sempre muito contundente e lúcido no que diz.
    E é interessante um homem das ciências exatas se destacar com tanto louvor na filosofia.
    Preciso ler esse também.

    Abraço Alan.

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    1. O cara não se contentou só com a matemática. Nessa área, muita gente importante tem ele como referência, como Alan Turing. Viveu por quase 100 anos de nunca se aquietou, mesmo em idade avançada ia em marchas, em protestos pelo pacifismo. Suas ideias são bastante racionais e lúcidas, acho que a parte das exatas ajuda nesse ponto.
      Recomendo a leitura desse livro, vai gostar de conhecê-lo!
      Obrigado pela visita.
      Abraço.

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  3. Tira do sério realmente quem quer falar de felicidade sendo rico. Ainda mais num país como o Brasil que possui a metade da riqueza concentrada na mão de 10% da população; talvez esse deve ser um dos motivos desse autor não ser tão popular por aqui.

    Quanto a atualidade da obra isso acontece frequente mente com os autores clássicos de países desenvolvidos. Em Kafka, no seu livro O Processo, ele já falava do caráter moroso, antiquado e até mesmo angustiante das instituições burocráticas, vez outras agem com certa arbitrariedade também.

    No Brasil, similar a obra do autor de língua alemã pode ser talvez (porque não li ainda, só pequenas resenhas) Angustia, de Graciliano Ramos.

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    1. É verdade, quando a preocupação financeira não é um problema, fica mais fácil focar em outras coisas que trazem felicidade. Mas Russell não fala de dinheiro no livro, não coloca como uma necessidade para a felicidade. Ele analisa situações da vida, coisas que acontecem com todo mundo. Ele não vai dizer sobre coisas que o dinheiro pode comprar, mas sim da família, do trabalho, sentimentos que todos têm. É um livro muito bom e atual por falar de situações que ainda vivenciamos, no mundo todo.
      Estou lendo ‘O processo’. Logo mais sairá a resenha!
      Obrigado pelo comentário.
      Grande abraço.

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  4. não li esse livro, mas o que você escreve sobre mesmo a análise do autor estar centrada em 1930 – ano da sua publicação – e reflete os uma certa atualidade, não apenas concordo com a sua afirmativa como avanço dizendo que quanto mais a leitura do passado se faz presente mais podemos comprovar o quanto de mínimo avançamos como sociedade, como coletivo, e mesmo em nível individual. mais outro na lista. um grande abraço, Alan.

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    1. Ao olhar para o passado, a grande diferença que fica é na questão tecnológica mesmo, não é? Tirando isso, continuamos praticamente iguais, tanto em organização social, quando no trabalho, modos de viver. Muitos problemas foram superados, mas outros surgiram. A luta do passado não é a mesma de agora, mas ainda há uma luta, de outro tipo. Isso seria interessante para refletirmos sobre como ainda temos muito a evoluir.
      Obrigado pela visita.
      Abraço.

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