Um livro para poucos – NML #13

Grande Sertão Veredas Companhia das Letras
Imagem: Reprodução.

Você pagaria mais de R$1000 por um livro?


O livro ‘Grande sertão: veredas’ não é uma das leituras mais fáceis do mundo, entretanto, isso não faz dele um livro para poucos (uma leitura difícil e desafiadora é boa e faz bem). Quando falo de “um livro para poucos”, não falo sobre a obra em si, mas sim sobre uma nova edição especial que a Companhia das Letras está produzindo e que, aliás, já está esgotada!

A editora adquiriu os direitos da obra e vai publicá-la agora em 2019. Uma nova edição que verá com novo estabelecimento de texto, cronologia do autor ilustrada com fotos, sugestões de leituras, ampla fortuna crítica e um breve recorte da correspondência entre Clarice Lispector e Fernando Sabino sobre o livro. A edição padrão já está em pré-venda, com um preço nem tanto acessível assim, porém, dentro da realidade que veremos ao longo do ano.

Esse “livro para poucos” é uma é uma edição de luxo, que terá um acabamento especial em capa dura com baixo relevo e costura aparente, guarda feita de papel artesanal da Moinho Brasil, produzido com cana-de-açúcar, com impressão em silk screen. O bordado é inspirado no avesso do Manto da apresentação, do artista Arthur Bispo do Rosário, com os nomes dos personagens do romance, e vestirá o livro feito uma sobrecapa. Ainda há uma faixa vermelha (que também estará na primeira tiragem da edição padrão) que terá um fechamento com botão feito artesanalmente pela Quiari Marcenaria, que envolverá o exemplar. O livro será entregue em uma caixa feita de buriti por uma rede de artesãs do sertão.

Pelas imagens, será um livro muito bonito, um verdadeiro item de colecionador. Apenas 63 exemplares serão produzidos, e o valor: míseros R$ 1190. Um valor fora da realidade dos brasileiros, mas trata-se de uma edição que visa um tipo de público em específico, pessoas que estão dispostas a pagar caro por itens de luxo, colecionadores.

Não é problema algum a editora cobrar o que deseja pelo seu produto, os funcionários sabem quanto tudo custará para ser produzido, a margem de lucro e etc. Seria um problema se apenas existisse esse tipo de edição, o que tornaria a obra inacessível para a grande maioria da população, uma vez que se trata de uma obra muito solicitada em vestibulares.

Todavia, nem todo mundo pensa como eu. Muita gente reclamou nas redes sociais, criticando o valor tão elevado, mesmo o da edição padrão. Isso é muito bom. É bom que a empresa receba críticas, para notar que seu público não está feliz, o que fará com que a editora melhores nas próximas decisões. Ademais, após essas críticas, foi anunciada uma edição econômica, que, provavelmente, será publicada em 2020, com um valor reduzido, fruto das críticas (os consumidores têm poder, são eles quem decidem quanto um produto deve custar ou não, o número de vendas dirá se o valor é justo).

Alguns comentários não faziam sentido, como os que perguntavam quanto as pessoas que irão bordar as capas receberão, se a editora não estaria lucrando muito sobre o trabalho dos outros. Esse tipo de pessoa não entende noções básicas de economia, ainda pensam em mais-valia (que já foi refutada inúmeras vezes). Quem borda sabe muito bem o que cobrar pelo próprio trabalho e a editora cobrou o que achou justo pelo seu produto, que vendeu, quem comprou achou justo o preço.

No meio de tantos comentários, houve alguns engraçados. Deixo aqui alguns:


Print dos comentários Guimarães Rosa Cia Das LetrasPrint dos comentários Guimarães Rosa Cia Das LetrasPrint dos comentários Guimarães Rosa Cia Das LetrasPrint dos comentários Guimarães Rosa Cia Das LetrasPrint dos comentários Guimarães Rosa Cia Das Letras


Você é fã de Guimarães Rosa? Pagaria mais de mil reais por um livro? Eu acho que, mesmo se eu fosse rico, não pagaria um valor desses. Por esse preço, a edição de luxo deveria conter mais itens e brindes, colecionáveis. A Editora Aleph fez uma campanha de financiamento coletivo (que foi um sucesso) para uma edição especial de ‘2001: uma odisseia no espaço’, que oferecia vários brindes, e nem se tratava de uma edição tão cara assim. Como a Companhia as Letras já ouviu o povo e produzirá uma edição econômica, talvez, nas futuras edições de luxo, a empresa possa oferecer mais brindes, para deixar o produto mais justo e chamativo. Dessa forma, talvez, as pessoas não enxerguem o produto como “caro”.

Alan Martins


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Autor: Alan Martins

Graduado em Psicologia. Amante da Literatura, resenhista e poeta (quando bate a inspiração). Autor e criador do Blog Anatomia da Palavra. Não sou crítico literário, porém meu pensamento é extremamente crítico. Atualmente graduando em Letras.

17 pensamentos

  1. Jamais compraria, mas aqueles que o querem que o façam. Agora, mais-valia refutada? só àqueles que seguem as refutadas teorias da escola de chicago e afins.
    Sobre “quem borda sabe muito bem o que cobrar pelo próprio trabalho”; não é assim que o jogo entre oferta e demanda funciona, principalmente quando a mão de obra é pouco especializada, descentralizada, e o comprador um gigante criando demanda temporária.

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    1. Se a pessoa acha justo cobrar o que quer por um serviço ou produto, ela que o faça, assim como a editora fez com o livro, que, apesar de muito caro, vendeu bem. O valor dessa edição não ficou caro por conta do material utilizado nele, o valor não foi colocado apenas para cobrir os gastos, ou seja, o preço final de um produto não está intrinsecamente ligado ao seu custo de produção, mas sim ao quanto as pessoas estão dispostas a pagar por ele.

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      1. A insistência na mesma afirmação diante de seu completo desmonte através de argumentação racional (e bem simples) é uma característica da desonestidade desse tipo de pensamento ideológico, mas eu vou morder a isca porque tenho o tempo a meu dispor nesse momento:

        A possibilidade do produtor colocar o preço que quiser em sua produção é uma ilusão que serve a narrativa dos grandes compradores. No mundo real, coloca-se o preço que o comprador está disposto a pagar, ou não vende.

        A ideia de que o valor do produto final se dá na hora da venda é o outro lado da mesma narrativa, se torna real através do adestramento dos consumidores por marketing agressivo e tem como efeito colateral a distorção da ideia de valor real que é tão prevalente na sociedade moderna.

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      2. Por isso eu falei que o preço de um produto não está preso ao seu valor de produção, mas sim a quanto estão dispostos a pagar por ele. Não dá para cobrar sempre o que se quiser, afinal pode ser um valor absurdo que ninguém estará disposto a desembolsar. Mas Há casos onde uma empresa pode puxar ao máximo o valor. Há outras empresas que não conseguirão aumentar seus preços, pois não há clientes para isso. Se tem gente disposta a pagar caro por um iPhone, isso justifica seu preço, assim como há celulares baratos, pois existem pessoas que os querem.
        Não dá para sair por aí colocando o preço que quiser, é preciso se ligar à realidade.
        Desonesto seria falar que o valor de algo está somente em seu custo de produção, trabalho envolvido. Algo que tenha valor para você pode não ter para mim, e se para mim não tem valor, então eu não vou pagar por aquilo. Mas há quem compre, o que justifica sua existência.
        O marketing pode criar um falso desejo de necessidade, por diversos fatores, que pode criar a ideia de valor de um produto, por isso seu preço aumenta, porque a pessoa sente necessidade e paga o que for necessário. Mas não é só o marketing, pessoas têm necessidades e podem fazer o que for por algo, mesmo sem marketing.

        P. S. Desculpe demorar para responder, eu fiquei muito tempo sem mexer no blog, um grande erro, aliás.

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      1. Confesso, já cheguei a gastar 100 € em um livro (por causa dos portes e da desalfandegação), que poderia ter saído por 50€ (mas a gente aprende… rs). Mas o livro tem quase 1000 páginas e compreende 5 livros mais extras, na verdade… Então, até que foi barato… rs

        Curtido por 1 pessoa

    1. Essa edição é um item de enfeite, para expor. Não acredito que quem comprou vai ler nela. É algo que foge do real motivo de um livro, que é a literatura. Transformou-se em uma peça de arte, como um quadro. E, pelo jeito, esse tipo de livro tem público.

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