“Poderia a literatura existir sem a imaginação?”
Título: A imaginação educada
Autor: Northrop Frye
Editora: Vide Editorial
Ano: 2017
Páginas: 136
Tradução: Adriel Teixeira; Bruno Geraidine; Cristiano Gomes
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“Liberdade nada tem a ver com falta de exercício: ela é produto de exercício. Não se é livre para ir e vir a menos que se tenha aprendido a andar, e não se é livre para tocar piano a menos que se pratique.” (FRYE, Northrop. A imaginação educada. Vide Editorial, 2017, p. 128)
Estudar um idioma sem estudar, em conjunto, a literatura criada a partir do mesmo, é um ato incompleto. E falar em literatura sem falar em imaginação, é algo praticamente impossível. É o que Northrop Frye defende neste livro: a literatura é fruto de uma imaginação educada.
Muito mais que um crítico
Nascido em 1912, o teórico da literatura e crítico literário canadense Northrop Frye é um dos nomes mais influentes do século XX para a teoria literária.
O Canadá não é um dos mais importantes centros mundiais da literatura. Com suas ideias inovadoras sobre a crítica literária como ciência, uma teoria da imaginação e todo seu vasto estudo, Frye fez o mundo se voltar à literatura canadense — tanto que, em 2013, a canadense Alice Munro foi laureada com o Nobel de Literatura.
Entre suas influências (e objetos de estudo) estão autores clássicos como William Blake, Shakespeare, John Milton e a Bíblia. O crítico literário estadunidense Harold Bloom cita Frye como o teórico que mais o influenciou.
“Como eu disse antes, na literatura nada há de novo que não seja o velho remoldado.” p. 61
Palestras
A rádio canadense CBC há muito tempo transmite palestras sobre assuntos de interesse geral, como cultura, arte, geopolítica, ciência e história. ‘A imaginação educada’ é a transcrição de seis palestras, com duração de trinta minutos cada, que Northrop Frye concedeu à rádio em 1962.
Dividido em seis capítulos (ou palestras), o livro aborda dois temas de grande interesse de seu autor: literatura e imaginação. Com uma linguagem simples e acessível, afinal o programa da CBC é transmitido para todo o país, Frye expõe muito bem sua teoria de que é preciso educar a imaginação para compreender a literatura, para se tornar um leitor crítico.
Essas seis palestras foram elaboradas para formar uma ideia fechada, do início ao fim, não são ideias separadas, ou cada palestra sobre um assunto diferente. Frye vai fazendo o leitor pensar consigo, apresentando seus argumentos de forma clara e precisa. Uma leitura rápida, fácil e muito enriquecedora.
“Hoje acho que as perguntas mais simples são não apenas as mais difíceis de responder, mas as mais importantes a fazer […]” p. 11
Mito e metáfora
As ideias que o autor expõe são muito interessantes, principalmente para quem ama literatura. Ele elabora três níveis diferentes da linguagem: a comum, do dia a dia, falada quase que de maneira automática; a linguagem mais elaborada, pensada, a científica; e a linguagem da literatura, da imaginação, composta por metáforas.
É com muita ênfase que Frye fala das metáforas, que, para ele, derivam dos mitos, trazendo a mesma essência clássica, porém em formas distintas, atualizadas. Segundo o autor, a poesia só existe por causa da metáfora e é composta por palavras que se encaixam, diferente da prosa, que, em romances, buscam um sentido para os diversos conflitos da humanidade.
Frye também aponta uma diferença entre a ciência e a literatura. Apesar de existir semelhanças entre ambas, a literatura é um processo que deriva da imaginação, não do mundo real, concreto. A ciência, mesmo fazendo bom uso da imaginação do cientista, fala sobre o que existe, não sobre um mundo imaginário, um mundo que gostaríamos que existisse.
Esse é apenas um resumo das ideias que o livro apresenta, será bem mais interessante lê-lo por completo. Garanto que será uma experiência muito gratificante.
“A meu ver, não se deveria apressar juízos de valor em literatura. Pouco vai ajudar o estudante dizer-lhe que A é melhor do que B, e menos ainda se no momento ele prefere B.” p. 100
Sobre a edição
Edição simples. Brochura, capa com orelhas, miolo em papel Chambril Avena (off-white), ótima diagramação, que facilita muito a leitura.
Bom trabalho de tradução. Creio que foi necessário mais de um tradutor por conta dos diversos poemas que o autor utiliza para explicar suas ideias.
Num primeiro momento, o leitor pode estranhar o fato de a ortografia do livro não seguir as regras do Acordo Ortográfico firmado em 1990. Essa é uma decisão da editora, nenhum de seus livros segue essas regras, por algum motivo que eu não sei. Então não ache tão estranho (ou ache) assim encontrar palavras acentuadas à moda antiga, ou utilizando trema.
“Em outras palavras, a literatura não só nos conduz à reconquista da identidade, mas também separa este estado do seu oposto: o mundo de que não gostamos e de que nos queremos afastar.” p. 48
Conclusão
De forma muito simples e precisa, Northrop Frye expõe suas ideias sobre literatura, imaginação e linguagem. O livro é composto por seis capítulos (que foram seis palestras concedidas pelo autor à rádio canadense CBC). Para Frye, a linguagem da literatura é a única que se diferencia das demais (da científica e a do senso comum), pois a literatura trabalha com a imaginação, criando um mundo que, apesar de representar problemas reais, não existe, um mundo ideal que só existe na imaginação de seu criador (e, posteriormente, na imaginação dos leitores). O autor também aponta a importância dos mitos para a literatura e para as metáforas, que dão vida à linguagem poética. Falar de literatura, sem falar sobre imaginação, é impossível. Então, como ensinar literatura sem educar a imaginação? Encontre essa e outras respostas nesse livro, que, apesar de pequeno, é riquíssimo, uma leitura necessária para todos aqueles que amam a literatura.
“Quanto maior a nossa exposição a crueldades pela ótica da literatura, menor a nossa chance de encontrar nelas um prazer secreto.” p. 88
Minha nota (de 0 a 5): 4,5
Alan Martins

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