Minhas Leituras #43: A senhora do lago – Andrzej Sapkowski

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“Encerrando a série em grande estilo”

Título: A senhora do lago, v. 1 e 2
Autor: Andrzej Sapkowski
Editora: WMF Martins Fontes
Ano: 2017
Páginas: 304 e 266
Tradução: Olga Bagińska-Shinzato
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“Até um homem simples, inclusive cheio de alegria, até eufórico, deveria entender que a política também é uma espécie de guerra, embora travada de uma maneira um pouco diferente” (SAPKOWSKI, Andrzej. A senhora do lago, v.2. WMF Martins Fontes, 2017, p. 139)

Em 2011, chegava às livrarias brasileiras ‘O último desejo’, uma coletânea de contos de um tal bruxo Geralt de Rívia, o primeiro livro de uma série composta por sete (oito, se contarmos um prelúdio, lançado recentemente). Agora, em 2017, a saga chega ao fim, fechando o arco dessa incrível história de fantasia em grande estilo.

O economista

Nascido em Łódź, Polônia, Sapkowski formou-se em economia e trabalhou como representante de vendas para uma empresa internacional. Sua carreira literária iniciou-se com traduções de histórias de ficção científica.

Seus contos mais conhecidos, os do bruxo Geralt de Rívia, começaram a ser publicados na década de 80, na revista Fantastyka. As histórias fizeram sucesso e logo foram publicadas coletâneas e depois os romances que davam continuidade à saga, tornando-o um dos autores mais conhecidos e cultuados em seu país.

Recebeu diversos prêmios, não apenas pela saga do bruxo, mas também pelos diversos outros livros que escreveu. Entretanto, Geralt é o seu personagem mais conhecido, é até considerado um símbolo nacional polonês. A trilogia de jogos ‘The witcher’, da produtora polonesa CD Projekt Red, é baseada nesse universo e ajudou a popularizar a obra de Sapkowski mundo afora.

“Hoje em dia, o Mal governa baseando-se nas leis que lhe são inerentes. Atua de acordo com os tratados de paz assinados, pois foi levado em consideração na hora de assiná-los…” v. 2, p. 239

O bruxo

Essa palavra possui um significado diferente nesse universo fantasioso. Um bruxo, ou bruxeador, é um humano, treinado desde criança, para ser um matador de monstros. Além de uma intensa preparação física, nas escolas de bruxo, essas crianças passam pelo teste das ervas, com a ingestão de potentes compostos, preparados para alterar o sistema fisiológico, tornando-as mutantes, algo útil para a profissão de bruxo, que caçam as feras mais terríveis.

Há diversas lendas sobre esses mutantes e as pessoas alimentam diversos preconceitos, porém, são considerados um mal necessário, já que salvam a população dos mais variados tipos de monstros, claro que em troca de boa recompensa.

Geralt de Rívia, o protagonista, é um bruxo, talvez o mais habilidoso de todos. Nesse último livro, ele mostra todo o seu potencial, indo até o fim do mundo, na companhia de seus amigos. Porém, esse mundo criado por Sapkowski é muito mais vasto e rico. Além de monstros, existem outros seres mitológicos (inspirados na mitologia eslava e nórdica), como unicórnios, dragões e vampiros. Temos viagens no tempo e espaço, com a premissa de que existem muitos outros mundos além desde onde vivemos, e o autor gosta de brincar com isso. A sociedade, formada por humanos, elfos, anões, gnomos e algumas outras raças, é muito bem constituída, referindo-se a questões políticas e econômicas (o lado economista do autor está sempre presente).

Trata-se de um mundo rico e sombrio, com o Norte sendo governado por reis mesquinhos, alguns mimados, aconselhados por feiticeiras não muito confiáveis. Ao Sul, temos o gigantesco império de Nilfgaard, governado pelo impiedoso Emhyr var Emreis e sua insistente busca por expansão, o que gera diversos conflitos com os reinos do Norte. Este é um mundo onde não há o bem e o mal, e esse é um tema que o autor gosta de trabalhar. Todos possuem seus interesses e fazem de tudo para alcançá-los. Entre o preto e o branco, há um vasto gradiente de cinza, onde a maioria das pessoas permanece.

“O bem e o justo devem triunfar, o mal, receber um castigo exemplar, e o amor, unir os amantes até a morte. E, droga, nenhum dos personagens positivos pode morrer!” v. 1, p. 27

Terminando em grande estilo

Em ‘A senhora do lago’, todos os eventos iniciados nos livros anteriores são concluídos. Aqui saberemos qual foi o destino de nossos protagonistas e do mundo em geral. Não é um romance grande, temos cerca de 570 páginas, todavia o autor não deixou a trama terminar de maneira rasa; esse número de páginas foi muito bem talhado. Não estou dizendo que a narrativa se torna muito descritiva e detalhista, pelo contrário, é rápida e constante, sem se esquecer de dar respostas, o que funciona muito melhor que detalhes excessivos que tiram o ritmo.

O humor ácido dos primeiros livros retorna, o que fez falta na aventura anterior. Sapkowski escreve de forma séria, mas sem se levar a sério. Há várias tiradas de alguns personagens, ou eventos irônicos, o que quebra um pouco da tensão, algo que sempre aconteceu ao longo da saga, lembrando-nos que, mesmo sendo uma história obscura e pesada, esta é uma obra de fantasia, escrita para divertir. E essa função é muito bem cumprida.

Um ponto forte do autor é a descrição das batalhas, a imagem formada ao ler é muito nítida. Por isso, a guerra que está ocorrendo é apresentada de uma maneira interessante, narrada a partir de vários pontos de vista (o romance em si é construído dessa maneira). Esse estilo de narrativa é uma boa maneira de mostrar a conclusão dos eventos, como cada camada da sociedade foi afetada.

Temas como racismo, xenofobia e economia sempre marcaram a saga, e aqui as coisas chegam ao ápice. Esta é a parte filosófica da obra, com divagações sobre o sentido da guerra, o papel do governo, questões existenciais e econômicas (nesse quesito, o ponto de vista do autor é bastante liberal, o próprio Geralt é baseado nessa filosofia, sempre entrando em embate com seus próprios princípios). As mulheres possuem um papel muito importante nesse universo, principalmente as feiticeiras, personagens fortes, de personalidade, donas de si, desempenhando grande influência na política.

Qual o destino do mundo? Quais as consequências da guerra? Qual foi o destino de Geralt, Ciri, da bruxa Yennefer e seus amigos? Todas essas respostas, e outros mistérios apresentados ao longo da saga, serão respondidas. Um belo encerramento, finalizando em grande estilo, com um final digno das tragédias gregas.

“O amor é como a cólica renal. Você nem imagina o que é até ter um ataque. E você nem acredita quando lhe falam sobre isso” v. 1, p. 110

Sobre a edição

Planejado para ser publicado em 2016, o livro sofreu alguns atrasos e foi publicado apenas em 2017, dividido em dois volumes. Isso mesmo, a editora repartiu um livro em dois. A desculpa da empresa foi a de que houve atrasos em diversos setores da produção, e dividindo-a em dois volumes seria uma forma de diminuir esse atraso. O segundo volume foi publicado no início desse mês de novembro, sendo assim, talvez fosse possível a publicação de um volume único ainda em 2017. Outro fato é o de a editora ter utilizado a arte das capas das edições espanholas (feitas por Alejandro Colucci), e lá o último livro também foi dividido em dois volumes. Enfim, o importante é que a saga foi concluída. Eles até planejam publicar, em 2018, um box e o prelúdio ‘Tempo de tempestade’.

Trata-se de uma edição padrão, brochura, capa comum, com orelhas, miolo em papel de coloração off-white, boa diagramação. A tradução, a partir do original em polonês, ficou por conta de Olga Bagińska-Shinzato, que já vinha traduzindo a saga desde ‘Batismo de fogo’, mantendo a qualidade do primeiro tradutor, Tomasz Barcinski, que nos deixou em 2014. Foi ele quem trouxe a saga ao Brasil, insistindo para que alguma editora a publicasse. Olga manteve a constância e a coerência, mesmo com algumas pequenas diferenças. Ao longo dos dois volumes, a revisão deixou passar alguns errinhos, nada comprometedor.

“O cinismo, com todo o seu ar de pseudointeligência, é extremamente falso” v. 1, p. 46

Conclusão

Conheci a série logo no início de sua publicação por aqui, em 2011. Sou fã dos livros e dos jogos. Percorri um longo caminho ao longo dos sete livros, e essa aventura ao lado do bruxo e seus amigos foi incrível, carregada de emoções e reviravoltas. O último livro é o que possui o ritmo mais frenético, sempre apresentando novas conclusões para os eventos. A história não para, há sempre algo acontecendo. Além de ser uma excelente obra de fantasia, apresenta também temas atuais, como debates sociais, éticos e sobre economia. Uma saga que merece ser conhecida, um dos maiores feitos da literatura fantástica recente e (por que não?), de todos os tempos.

“Tudo tem o seu preço. A guerra exige vítimas. A paz, pelo visto, também” v.2, p. 145

Minha nota (de 0 a 5): 5

Alan Martins

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A arte de Alejandro Colucci é simplesmente incrível!

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Autor: Alan Martins

Graduado em Psicologia. Amante da Literatura, resenhista e poeta (quando bate a inspiração). Autor e criador do Blog Anatomia da Palavra. Não sou crítico literário, porém meu pensamento é extremamente crítico. Atualmente graduando em Letras.

11 pensamentos

    1. Olha o alerta de spoiler!!!

      Me pareceu isso também, e essa também parece ter sido a interpretação da CD Projekt RED, sobretudo nas cutscenes de The Witcher 2.

      Eu não curti muito esse final, aquilo que acontece com os dois. Ficou sem graça.

      Obrigado pela visita e por comentar!

      Abraço.

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  1. qual sua opinião sobre o que aconteceu com o Gerald e Yennefer ? morreram e ficaram juntos para sempre , ciri levou eles para outro mundo ? O próprio autor falou que o final foi feito para ter várias interpretações , eu acredito que ficaram juntos no que seria o limbo , por isso ciri chora ao contar aquela versão do casamento que ela criou

    Curtido por 1 pessoa

    1. Não parece que eles morreram, ou se morreram, suas almas foram parar em algum lugar. O autor quis encerrar sua história, e não deixou muita brecha para uma continuação direta, tanto que nos jogos é até meio confusa a maneira com que as coisas são explicadas, pouco convincentes eu diria. Acho que ficaram juntos, agora não sei se vivos ou mortos.

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      1. Isso não é algo que ficou claro nos livros. Pode ser porque ele viu que seu plano (de se casar com a própria filha) era abominável, ou talvez ele se sinta em dívida com Geralt, pois este o ajudou quando estava disfarçado de Duny, ou talvez seja pelo fato de Ciri gostar de Geralt e Yennefer, a verdadeira família dela. E o imperador não precisava mais dela, ele poderia se casar com a Ciri falsa e ninguém saberia dizer se era a verdadeira ou não, continuando como o imperador de Nilfgaard.

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